b) Argumentação: como a carta não
deixa de ser uma espécie de dissertação argumentativa, você deverá selecionar
com bastante cuidado e capricho os argumentos que sustentarão a sua tese. É
importante convencer o leitor de algo.
c) Cabeçalho: na primeira linha
da carta, na margem do parágrafo, aparecem o nome da cidade e a data na qual se
escreve. Exemplo: Londrina, 15 de março de 2003.
d) Vocativo inicial: na linha de
baixo, também na margem do parágrafo, há o termo por meio do qual você se
dirige ao leitor (geralmente marcado por vírgula). A escolha desse vocativo
dependerá muito do leitor e da relação social com ele estabelecida. Exemplos:
Prezado senhor Fulano, Excelentíssimo senhor presidente Luís Inácio Lula da
Silva, Senhor presidente Luís Inácio Lula da Silva, Caro deputado Sicrano, etc.
e) Interlocutor definido: essa é
a principal diferença entre a dissertação tradicional e a carta. Quando alguém
pedia a você que produzisse um texto dissertativo, geralmente não lhe indicava
aquele que o leria. Você simplesmente tinha que escrever um texto. Para alguém.
Na carta, isso muda: estabelece-se uma comunicação particular entre um eu
definido e um você definido.
f) Necessidade de dirigir-se ao
leitor: na dissertação tradicional, recomenda-se que você evite dirigir-se
diretamente ao leitor por meio de verbos no imperativo (“pense”, “veja”,
“imagine”, etc.). Ao escrever uma carta, essa prescrição cai por terra. Você
até passa a ter a necessidade de fazer o leitor “aparecer” nas linhas. Se a
carta é para ele, é claro que ele deve ser evocado no decorrer do texto. Então,
verbos no imperativo – que fazem o leitor perceber que é ele o interlocutor – e
vocativos são bem-vindos. Observação: é falha comum entre os alunos-escritores
“disfarçar” uma dissertação tradicional de carta argumentativa. Alguns escrevem
o cabeçalho, o vocativo inicial, um texto que não evoca em momento algum o
leitor e, ao final, a assinatura. Tome cuidado! Na carta, vale reforçar, o leitor
“aparece”.
g) Expressão que introduz a
assinatura: terminada a carta, é de praxe produzir, na linha de baixo (margem
do parágrafo), uma expressão que precede a assinatura do autor. A mais comum é
“Atenciosamente”, mas, dependendo da sua criatividade e das suas intenções para
com o interlocutor, será possível gerar várias outras expressões, como “De um
amigo”, “De um cidadão que votou no senhor”, De alguém que deseja ser
atendido”, etc.
h) Assinatura: um texto pessoal,
como é a carta, deve ser assinado pelo autor. Nos vestibulares, porém, costuma-se
solicitar ao aluno que não escreva o próprio nome por extenso. Deve escrever a
inicial do nome e dos sobrenomes (J. A. P. para João Alves Pereira, por
exemplo) ou, somente a inicial do prenome deve aparecer (J. para o nome
supracitado). Essa postura adotada pelas universidades é importante para que se
garanta a imparcialidade dos corretores na avaliação das redações
Prezado editor,
O senhor e eu
podemos afirmar com segurança que a violência em Londrina atingiu proporções
caóticas. Para chegar a tal conclusão, não é necessário recorrer a
estatísticas. Basta sairmos às ruas (a pé ou de carro) num dia de
"sorte" para constatarmos pessoalmente a gravidade da situação. Mas
não acredito que esse quadro seja irremediável. Se as nossas autoridades
seguirem alguns exemplos nacionais e internacionais, tenho a certeza de que
poderemos ter mais tranqüilidade na terceira cidade mais importante do Sul do
país.
Um bom modelo de
ação a ser considerado é o adotado em Vigário Geral, no Rio de Janeiro, onde
foi criado, no início de 1993, o Grupo cultural Afro Reggae. A iniciativa,
cujos principais alvos são o tráfico de drogas e o subemprego, tem beneficiado
cerca de 750 jovens. Além de Vigário Geral, são atendidas pelo grupo as
comunidades de Cidade de Deus, Cantagalo e Parada de Lucas.
Mas combater
somente o narcotráfico e o problema do desemprego não basta, como nos demonstra
um paradigma do exterior. Foi muito divulgado pela mídia - inclusive pelo seu
jornal, a Folha de Londrina - o projeto de Tolerância Zero, adotado pela
prefeitura nova-iorquina há cerca de dez anos.
Por meio desse plano, foi descoberto que, além de reprimir os homicídios relacionados ao narcotráfico (intenção inicial), seria mister combater outros crimes, não tão graves, mas que também tinham relação direta com a incidência de assassinatos. A diminuição do número de casos de furtos de veículos, por exemplo, teve repercussão positiva na redução de homicídios.
Por meio desse plano, foi descoberto que, além de reprimir os homicídios relacionados ao narcotráfico (intenção inicial), seria mister combater outros crimes, não tão graves, mas que também tinham relação direta com a incidência de assassinatos. A diminuição do número de casos de furtos de veículos, por exemplo, teve repercussão positiva na redução de homicídios.
Convenhamos,
senhor editor: faltam vontade e ação políticas. Já não é tempo de as nossas
autoridades se espelharem em bons modelos? As iniciativas mencionadas foram
somente duas de várias outras, em nosso e em outros países, que poderiam sanar
ou, pelo menos, mitigar o problema da violência em Londrina, que tem assustado
a todos.
Espero que o senhor publique esta carta como forma de exteriorizar o protesto e as propostas deste leitor, que, como todos os londrinenses, deseja viver tranquilamente em nossa cidade.
Espero que o senhor publique esta carta como forma de exteriorizar o protesto e as propostas deste leitor, que, como todos os londrinenses, deseja viver tranquilamente em nossa cidade.
Atenciosamente,
M.
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(Nome da cidade e data)
PREZADOS SENHORES,
Uns amigos me falaram que
os senhores estão para destruir 45 mil pares de tênis falsificados com a marca
Nike e que, para esse fim, uma máquina especial já teria até sido adquirida. A
razão desta cartinha é um pedido. Um pedido muito urgente.
Antes de mais nada, devo dizer aos senhores que nada tenho contra a destruição de tênis, ou de bonecas Barbie, ou de qualquer coisa que tenha sido pirateada. Afinal, a marca é dos senhores, e quem usa essa marca indevidamente sabe que está correndo um risco. Destruam, portanto. Com a máquina, sem a máquina, destruam. Destruir é um direito dos senhores.
Antes de mais nada, devo dizer aos senhores que nada tenho contra a destruição de tênis, ou de bonecas Barbie, ou de qualquer coisa que tenha sido pirateada. Afinal, a marca é dos senhores, e quem usa essa marca indevidamente sabe que está correndo um risco. Destruam, portanto. Com a máquina, sem a máquina, destruam. Destruir é um direito dos senhores.
Mas, por favor, reservem um par,
um único par desses tênis que serão destruídos para este que vos escreve. Este
pedido é motivado por duas razões: em primeiro lugar, sou um grande admirador
da marca Nike, mesmo falsificada. Aliás, estive olhando os tênis pirateados e
devo confessar que não vi grande diferença deles para os verdadeiros.
Em segundo lugar, e isto é o
mais importante, sou pobre, pobre e ignorante. Quem está escrevendo esta carta
para mim é um vizinho, homem bondoso. Ele vai inclusive colocá-la no correio,
porque eu não tenho dinheiro para o selo. Nem dinheiro para selo, nem para
qualquer outra coisa: sou pobre como um rato. Mas a pobreza não impede de
sonhar, e eu sempre sonhei com um tênis Nike. Os senhores não têm ideia de como
isso será importante para mim. Meus amigos, por exemplo, vão me olhar de outra
maneira se eu aparecer de Nike. Eu direi, naturalmente, que foi presente (não
quero que pensem que andei roubando), mas sei que a admiração deles não
diminuirá: afinal, quem pode receber um Nike de presente pode receber muitas
outras coisas. Verão que não sou o coitado que pareço.
Uma última ponderação: a mim não
importa que o tênis seja falsificado, que ele leve a marca Nike sem ser Nike.
Porque, vejam, tudo em minha vida é assim. Moro num barraco que não pode ser
chamado de casa, mas, para todos os efeitos, chamo-o de casa.
Uso a camiseta de uma universidade americana, com dizeres em inglês, que não entendo, mas nunca estive nem sequer perto da universidade – é uma camiseta que encontrei no lixo. E assim por diante.
Uso a camiseta de uma universidade americana, com dizeres em inglês, que não entendo, mas nunca estive nem sequer perto da universidade – é uma camiseta que encontrei no lixo. E assim por diante.
Mandem-me, por favor, um tênis.
Pode ser tamanho grande, embora eu tenha pé pequeno. Não me desagradaria nada
fingir que tenho pé grande. Dá à pessoa uma certa importância. E depois, quanto
maior o tênis, mais visível ele é. E, como diz o meu vizinho aqui, visibilidade
é tudo na vida.
Atenciosamente
– (despedida formal)
(O nome do emissor, isto é, a
pessoa que enviou a carta)
(Moacyr Scliar, cronista da Folha de S. Paulo, 14/8/2000).
Aula ministrada no dia 07/03/2012, pela professora Danielle Sherem Spirandelli Bastos.
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